A leitura é conhecida por proporcionar vários benefícios, como o aumento da imaginação e da criatividade, a ampliação vocabular, o desenvolvimento do senso crítico, melhoria das capacidades emocionais, e muitos outros. Porém, embora existam todas essas vantagens, que apenas garantem resultados positivos, o Brasil é um país com pouquíssima prática da leitura, sobretudo pelas desigualdades sociais existentes e pelo reforço das mesmas, através da visão de que "a leitura é apenas para ricos", como afirmou o próprio Ministro da Economia, Paulo Guedes.
Segundo dados divulgados na 5ª edição da pesquisa "Retratos da Leitura no Brasil", desenvolvida pelo Instituto Pró-Livro, o brasileiro lê em média 4,95 livros ao ano, sendo somente 2,43 lidos do início ao fim. Essa última pesquisa, feita em 2019, ainda traz dados sobre a pouca quantidade de leituras, entre leitores e não leitores, que afirmam ser a "falta de tempo" a principal responsável por esse cenário. Tais informações apenas reafirmam a falta de adesão da leitura por parte dos brasileiros, visto que não a enxergam como uma atividade de lazer, assim como assistir televisão ou usar a internet, por exemplo.
A mesma pesquisa, entretanto, trouxe dados positivos para o Nordeste. Eleita a região que mais lê, representou com 5 estados no ranking, estando no topo a capital paraibana, João Pessoa, com 64% da população considerada leitora. Apesar disso, sabe-se que há grandes dificuldades com relação ao acesso, ou seja, mesmo que os índices de leitura estejam crescendo pouco a pouco, há muito o que ser feito para atender a comunidade como um todo.
Em entrevista, alunos e professoras da Escola Cidadã Integral Professor Itan Pereira, da cidade de Campina Grande - PB, contaram sobre a realidade da escola pública, que mesmo com desafios conseguem fornecer aos alunos materiais de leitura, e mais, realizar projetos que incentivem esse hábito tão importante. Os estudantes Júlia Gabriele (16) e Arthur Quirino (16), afirmam serem leitores e conseguirem ler ao menos 1 livro por mês, mas reconhecem o privilégio que possuem e sabem que muitas pessoas, da mesma idade deles ou mais novas, não contam com igual oportunidade.
As professoras Rosa Nascimento (58) e Heidiane Feitosa (34) contaram um pouco sobre a experiência enquanto educadoras no processo do incentivo à leitura. Prof. Rosa destacou a liberdade que a instituição concede aos alunos, ao permitirem a escolha de livros para discussão a partir do gosto de cada um. Além disso, mencionou a preferência dos estudantes por contos e também poesias, graças aos trabalhos em sala de aula com as obras de Augusto dos Anjos.
Já a prof. Heidiane, afirmou algo muito intrigante ao ser perguntada sobre o interesse pela literatura por parte dos jovens:
"Se pensarmos em literatura, aquela lá da escola, que aprendemos por meio das escolas literárias, não, os alunos pouco se interessam. No entanto, há hoje outras opções… a internet, as redes sociais, disponibilizam, atualmente, gêneros literários que os jovens procuram, gostam e leem."
Ademais, a professora ainda afirmou a importância de relacionar os livros com outros "instrumentos" de entretenimento que o aluno goste e consuma, como filmes e séries. Isto é, incorporar a literatura na realidade do outro, e não simplesmente impor algo totalmente fora da bolha, o que demonstra o estímulo de forma respeitosa, de acordo com o tempo de cada pessoa.
Alunos da Escola Professor Itan Pereira, Arthur Quirino e Júlia Gabriele:
O reflexo do incentivo à leitura em sala de aula é tão significativo que na pesquisa do "Retratos da Leitura no Brasil", 52% dos entrevistados afirmaram terem iniciado o interesse pela literatura graças a escola ou a algum professor. Seguindo essa perspectiva, através de um evento de empreendedorismo desenvolvido por uma escola privada campinense, que o projeto "Leitores da Alegria" foi criado, cujo objetivo é incitar o hábito por meio de leituras dinâmicas em escolas, públicas e particulares.
Vale salientar que, apesar de ter sido desenvolvido dentro de um núcleo restrito, o trabalho tem buscado se expandir gradativamente. Com o intuito de descobrirmos mais sobre a proposta, entrevistamos duas integrantes da equipe, buscando entender melhor sobre o que fazem e o que planejam para o futuro do projeto.
Rafaela Albuquerque (16) e Isadora Barbosa (16) são alunas do 2º ano do ensino médio, e junto com outras meninas e dois professores, desenvolveram a proposta desse serviço através do desejo comum de trabalharem com algo relacionado à leitura, e que instigasse tal prática. Porém, mesmo com grande empenho, dificuldades não faltaram, principalmente por ser um serviço e não um produto. Apesar disso, a equipe realizou várias pesquisas, de campo e online, procurou patrocinadores e se dedicou ao máximo para mostrar que o projeto valia a pena.
O propósito do trabalho é ler para crianças e adolescentes, mostrando que esse incentivo pode partir de 'jovem para jovem'. Por meio de visitas em escolas públicas e/ou privadas, eles fazem leituras dinâmicas que instiguem o debate, mas sobretudo, o interesse para conhecer outras estórias. Entretanto, é importante evidenciar as disparidades existentes entre o cenário público e privado, o que inclusive, foi exemplificado por Rafaela durante a entrevista, de acordo com o que já presenciou nas oficinas:
"De 10 crianças da escola privada, 8 já tinham lido algum livro ou têm acesso; já na escola pública, de 10 crianças, 3 no máximo, já pegaram em um livro."
Essa situação acaba refletindo muito na forma como essas crianças reagem após as leituras, e no quanto elas se sentem confortáveis para comentar sobre a relação com os livros. Mas, infelizmente, é um cenário que ressalta as desigualdades do país, provando que o 'buraco é bem mais embaixo'.
Todavia, sem desanimar, as meninas do "leitores da alegria" compartilharam sobre as expectativas futuras. Um dos desejos é continuar promovendo oficinas nas instituições de ensino, contudo, o principal objetivo é conduzir o projeto para o âmbito nacional e construir uma rede de apoio para causar essa mudança tão necessária. E para ganharem mais visibilidade, desenvolveram um site, que explica sobre o trabalho, recebe inscrições para voluntários e doações de livros, que também são aceitas pelo Instagram.
Confira alguns dos registros da entrevista:
O hábito se cria do incentivo, e quanto mais cedo ele surge, melhor ainda. No caso de Crystiano de Vasconcelos Mariano, de apenas 4 anos, o seu contato com os livros é desde bebê, estimulado por seu primo Lucas, que pretende manter tal prática até ele ser alfabetizado. Aproveitando esse acesso, realizamos um pequeno ensaio fotográfico, em que fica nítido o conforto que o menino tem com os livros, e que só tende a se ampliar em um futuro próximo. E, embora a realidade do pequeno Crystiano ainda seja distante para muitas crianças e jovens, é um retrato que nos enche de esperança e nos instiga a tornar isso cada vez mais comum.
Confira as fotos do ensaio:
FICHA TÉCNICA:
Cobertura Fotográfica: Ana Flávia Aires, Hillary Costa, Kauanny Lima e Lucas Gonçalves
Reportagem: Ana Flávia Aires, Hillary Costa e Kauanny Lima
Produção Textual: Ana Flávia Aires
Supervisão Editorial: Rostand Melo
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