Em 29 de junho de 2007, no que viria a ser o seu momento mais importante, a gigante da tecnologia Apple lançou o primeiro Iphone, um aparelho compacto capaz de atender a todas as necessidades de conexão de acesso à internet aonde quer que se esteja. Seu sucesso instantâneo incitou processos de mudança que alteraram para sempre o jeito de se comunicar, partilhar e consumir conteúdo, e mesmo de pensar.
Distâncias comunicativas se extinguiram, com sistemas de mensagens e ligações de vídeo que conectam uma ponta do globo a outra. O papel da mídia, a autopercepção e as formas de sociabilidade entraram em questionamento com o advento das redes sociais. O ambiente de trabalho modificou-se para adotar o uso desses aparelhos em sua cadeia produtiva, quebrando a barreira entre pessoal e profissional de formas jamais vistas antes.
No entanto, a reverberação mais impactante para o futuro está começando a ser sentida agora na área da educação.
Com mais de 80% das crianças com 10 anos ou mais possuindo um aparelho celular pessoal, segundo o censo do IBGE de 2021, e o tempo de uso impulsionado pelo período de pandemia, a dependência aos smartphones torna-se cada vez mais expressiva nas escolas, causando diversos problemas para os alunos e, consequentemente, para os professores. Dores de cabeça, falta de concentração, deterioração das capacidades motoras, atritos sociais e diminuição das capacidades cognitivas são apenas alguns deles.

Em virtude disso, os profissionais da educação têm buscado novas alternativas para combater o vício, tanto colégios da rede pública de ensino quanto na rede particular. Uma das instituições de ensino que busca adotar métodos contra isso é o Murilo Braga, uma das instituições públicas mais antigas de Campina Grande. Fundada em 1957, a escola está localizada no bairro da Liberdade e se encontra em atividade até os dias atuais. De acordo com o Censo Escolar de 2023, o colégio conta com aproximadamente 400 alunos matriculados do ensino fundamental e médio.
O colégio segue a lei 8.949, de 03 de novembro de 2009, que dispõe sobre a proibição do uso de celular nas escolas da rede pública e privada do Estado da Paraíba. Desde o final da pandemia, a autoridade da lei foi se dissipando e atualmente, não é respeitada por parte dos estudantes.
De acordo com Marcílio Araújo, vice-diretor do Murilo Braga: “vemos na realidade uma distância comportamental dessas crianças. O colégio orienta os professores a utilizarem o celular apenas em atividades pedagógicas, mas a dependência dos alunos os impede de manter o foco, fazendo a atividade em questão ser esquecida em favor dos outros usos do aparelho”.
Ao serem questionados sobre o uso indevido, os alunos são encaminhados para a direção, onde as medidas necessárias são tomadas. A principal é de contatar os responsáveis pelo aluno, e explicar a situação. Mas, com a frequência e a gravidade dos casos, os próprios responsáveis não conseguem controlar os estudantes.
“Geralmente, a maior dificuldade hoje é a direção da escola chamar a família. Chegamos a casos em que o aluno se revoltava, principalmente em casa. Quando chegava em casa, o descontrole com os pais era notório, porque ele quer o celular. Muitas vezes a mãe chegava aqui e mandava a gente recolher o celular, mas nós não podemos recolher, a escola não tem essa autorização. A escola tem que procurar mecanismos pedagógicos, com todo o corpo docente, para encontrar uma maneira. Mas não é fácil.” - Afirma o vice-diretor Marcílio Araújo.

Nos casos em que os professores percebem o uso do celular em sala, a direção indica realizar a retirada de sala, para levá-lo à coordenação onde é feito um relatório que detalha o ocorrido para os responsáveis. Se o episódio se repetir, o aluno irá receber uma suspensão de dois dias, ação que não se mostra eficaz. Em última instância, o aluno pode ser encaminhado para o Conselho Tutelar.
Já no caso do Colégio Autêntico, a instituição é mais receptiva com a utilização do celular. Em atividade há 26 anos, o colégio não possui uma norma fixa para a proibição total do uso. Marco Danilo, coordenador geral do colégio, afirma que não se pode implementar o uso como obrigatório, nem tão pouco ser obrigatório não utilizá-lo.
O colégio implementa a utilização em atividades pedagógicas, como por exemplo, em jogos educativos para promover dinâmicas que facilitem o aprendizado. Porém, se o aluno se dispersar e utilizar o aparelho para fins pessoais, o professor pode recolher o aparelho e encaminhar o aluno para a coordenação, onde é decidido se é necessário acionar o comparecimento dos responsáveis para recolher o aparelho, ou se o aluno deve esperar até o final do expediente para buscar o seu dispositivo.
Tendo como ponto principal a conscientização, o colégio se mostra resistente a utilizar métodos mais rígidos, tentando, sobretudo, prezar pelo bem-estar do aluno, utilizando a educação como principal ferramenta para evitar normas mais extremas. Contudo, Danilo teme que essas medidas mais drásticas possam ser necessárias em um futuro próximo.
“Nós estamos em processo de avaliação. A princípio, não queremos implementar a regra por ser a mais radical. Seguramos mais um pouco, porque queremos trabalhar muito mais a conscientização. Mas, se não chegar a um denominador comum, talvez a gente vá ter algum tipo de medida como essa.”

Em concordância com o Autêntico, a equipe do Motiva, outra instituição de ensino da rede privada, também defende a anuência do uso do celular em aula. O colégio tomou a iniciativa conhecida como “bolsão”. Vigente há aproximadamente três anos, o objetivo é direcionar o foco do aluno para o que está sendo ministrado em sala, e para tanto, é pedido no início da aula que o aluno deixe o aparelho guardado em um compartimento que se encontra ao lado da porta. Terminada a aula, o aluno pode recuperar seu aparelho e utilizá-lo até a chegada do próximo professor.
Larissa Almeida, supervisora do ensino médio, procurou ressaltar para os alunos a importância da iniciativa, através de diálogos.
“A gente primeiro convenceu o aluno de que aquele bolsão era importante para ele. E aí os professores reforçam, ficando de olho. E quando o professor entra na sala, ele olha o bolsão e diz, ‘pessoal, está faltando celular aqui, vamos?’. A gente percebe que quanto mais distante desse tipo de distração, mais fácil é para o professor conseguir ali a concentração deles”.


Com a implementação da norma, os números de casos relacionados ao uso diminuíram consideravelmente. Em alguma eventualidade onde o aluno ainda estiver utilizando, ele será encaminhado para a coordenação, onde os supervisores irão dialogar para entender o lado do jovem.
Com o agravamento da dependência, vem se intensificando a discussão sobre a total proibição do aparelho nas instituições. Contudo, o valor educacional que o aparelho pode oferecer rebate este argumento.
Sérgio Elano, professor de biologia do ensino médio do Motiva, se posiciona contra a proibição por valorizar os seus benefícios para o aprendizado.
“Embora o celular seja algo que tem criado muita dependência, em sala de aula a gente tem que conter um pouco ela e não condenar o uso. O uso do celular não é condenável, desde que tenha um propósito pedagógico. Dizer assim, é radical, mas se for pela conveniência da instituição eu não condeno.”

Já Edson Mário, professor de matemática do ensino médio do Murilo Braga, apoia a proibição em todo o ambiente escolar. Para ele, o problema deve ser resolvido a partir da iniciativa da escola ou do governo com a proibição total do uso do celular em sala de aula, visando a melhoria do ensino. Mas reforça que tal ação iria trazer histeria, tendo em vista que atualmente o uso do celular é uma parte do corpo dos jovens.

O assunto ainda se mostra controverso. É uma discussão que requer mais atenção e pesquisa, para entender tanto o lado dos profissionais da educação como dos alunos que possuem o vício. Com o crescimento constante da tecnologia, novas ferramentas para o aprimoramento do aprendizado vão surgindo, o que deixa novas brechas para qual seria a conclusão do problema: a proibição ou não proibição. Enquanto isso, apelar para a conscientização ainda tem sido o caminho mais trilhado.
EXPEDIENTE:
Texto e Reportagem: Márcio Júnior, Nicolas Ferreira, Paulo Sérgio e Vinícius Moura
Fotografia: Nicolas Ferreira e Vinícius Moura
Supervisão Editorial: Ada Guedes e Rostand Melo
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