Entre Bancas e Sonhos: Alex Cavalcante e a vida real por trás da feira
- Coletivo F8
- 18 de set.
- 6 min de leitura

Alex Cavalcante Faustino tem 51 anos, é natural do Rio de Janeiro e veio para Campina Grande, Paraíba, ainda bebê. Em busca de oportunidades de trabalho para garantir o sustento da família, seu pai trabalhou em feiras e empresas deixando como herança para os filhos a disposição para o trabalho e a necessidade da labuta ainda na adolescência. Aos 15 anos Alex também começou a dedicar a sua vida ao trabalho nas feiras livres, enfrentando as dificuldades e conquistas que essa jornada trouxe.
Foi na Feira Central de Campina Grande, reconhecida como Patrimônio Cultural do Brasil em 2017 pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), que Alex forjou sua vida. Foi lá também onde conheceu Rozangela Rocha Faustino, com quem casou e constituiu família. Suas filhas Alessandra Rocha Faustino e Karen Emanuella Rocha Faustino passaram sua infância entre a escola e o box de temperos dos pais na feira.
Nesta entrevista trazemos um pouco da história deste homem que tem sua trajetória marcada pelo trabalho, mas também pela satisfação de fazer o que gosta com honra e leveza e no local que não apenas te acolheu como se fez extensão da sua casa.
Fale um pouco sobre você?
Saí de casa aos 11 anos para trabalhar em Pernambuco, como peão de tomate. Depois, voltei para Campina Grande, mas não fiquei muito tempo. Passei por Cubati, também na Paraíba, depois segui para Boqueirão e Barra de Santana. No fim das contas, acabei retornando para Catolé de Boa Vista. Tudo isso em busca de trabalho. Sempre trabalhei desde muito novo.
Alguém da sua família já trabalhava como feirante ou em comércio?
Algumas vezes. Meu pai saiu do antigo emprego, no antigo Hiper Bompreço e trazia a gente pra trabalhar na feira. A gente era muito novo ainda, tinha 12 anos só.
Como concilia o trabalho na feira com a vida pessoal e familiar?
Aquela história. É misturada as duas coisas. A gente vive no trabalho e na vida pessoal. Meus filhos foram criados aqui, trazíamos pra feira bebês ainda e ficavam o dia aqui dentro das cestas de ração com as almofadas.
A gente vive no trabalho e na vida pessoal. Meus filhos foram criados aqui, trazíamos pra feira bebês ainda e ficavam o dia aqui dentro das cestas de ração com as almofadas.
Se não fosse feirante, que outra profissão escolheria?
Se não fosse feirante, acho que hoje eu estaria no Rio de Janeiro, bem... sei nem dizer! Aproveitando, né? (risos)
Qual é a sua maior realização profissional?
Graças a Deus eu tenho minha vida mais estabilizada, certo? E tenho um emprego certo, não dependendo de patrão. Aqui sou eu e a mulher e nossa rotina, sem abuso, sem estresse. É a melhor coisa que o cabra pode ter é a tranquilidade, a garantia do pão de cada dia e a independência de ter o que é seu.
Como é a sua rotina de trabalho, desde a preparação até o final do dia?
É aquela rotina puxada, das seis da manhã às seis da tarde. Quem trabalha por conta própria sabe: se não se esforçar, não dá certo. Se deixar nas mãos dos outros também não dá certo. Não dá pra ir hoje numa hora, amanhã em outra. Tem que focar e bater a meta do dia, deixar a garantia para o cliente de que vocês estará lá, o produto estará lá.
Já aconteceu alguma história engraçada ou inusitada com um cliente?
O que eu acho engraçado aqui é que é história atrás de história, de palmo em palmo. Muita gente vem procurar remédio para ficar mais forte, certos tipos de força, sabe? (risos) Outros querem algo para trazer mais felicidade. Tem de tudo por aqui, ervas, soluções e muitas histórias curiosas.
Quais são os maiores desafios da profissão hoje em dia?
É a concorrência. Dia após dia, tem que matar um leão e dos grandes! Começamos devagar, trabalhando pequeno, mas precisamos concorrer com os grandes. Hoje tem gente com loja grande e bem localizada vendendo ervas, que muitas vezes vem daqui, do meu produto, mas ganha um nome, uma fama e acaba pegando uma parte da freguesia. Minha garantia é um produto puro, sem mistura e com qualidade.
Houve mudanças significativas na forma como os feirantes lidam com seus produtos e com o público ao longo do tempo?
De 2015 pra cá muita coisa mudou. O público começou a pegar mais gosto por comidas naturais, por uma alimentação mais saudável. Hoje em dia, essa tendência só cresce, tá todo mundo mais focado em cuidar da sua alimentação. Isso pro meu ramo é bom, melhora pra mim.
Quais mudanças percebeu no comportamento dos consumidores na feira central nos últimos anos?
Pouca coisa mudou pra quem vive da feira central, pra quem já é acostumado com esse ritmo. Nunca deixam de vir. Eu conheço as mães, os pais, os filhos e até os netos dos meus fregueses. São gerações inteiras que continuam marcando presença porque a feira é uma grande família. Então pra muitos a tradição de ir pra feira continua e é por isso que a gente continua também. Tem gente que sabe que nosso produto é puro, não
tem mistura e não quer perder essa segurança. Hoje tem também as entregas, as facilidades que a gente tenta acompanhar, sabe?
Como a pandemia impactou a feira central e quais foram os meios que encontrou na época para manter sua renda?
Na pandemia, o impacto foi grande. No começo, ficamos uma semana em casa, mas depois as coisas foram relaxando. Seguíamos as prevenções, era luvas, máscaras, álcool em gel ou líquido e, mesmo com medo, a gente vinha. Só que o comércio caiu bastante. Nos sábados de manhã, o movimento era bem fraco. Quase ninguém aparecia, só os próprios comerciantes. A gente ficava aqui esperando ver se aparecia cliente, tentando entregar em domicílio. Mas, na maior parte do tempo, ficamos em casa, torcendo para que alguém fizesse um pedido. O impacto foi forte, e o comércio sentiu isso muito forte mesmo.
Como a digitalização e os pagamentos eletrônicos influenciaram as vendas?
O Pix veio para facilitar muita coisa. Com ele, não tem problema de troco nem de perder centavos, é rápido, prático e resolve tudo na hora. Mas, com essa facilidade, também vêm os riscos. Tem gente de má-fé que tenta se aproveitar, não paga e ainda quer passar a perna nos outros.
Temos visto em nossa cidade, uma mudança no espaço urbano marcada pela expansão de comércios nos bairros. Isso tem diminuído o fluxo de clientes na feira?
O movimento na feira diminuiu porque os comércios de bairro oferecem variedade, aceitam cartão e é perto de casa, fica mais conveniente, né? Na feira, poucos vendedores aceitam cartão, o que afasta clientes. Além disso, ir até a feira pode gerar custos extras, como passagem, com frete. Hoje, a maioria dos frequentadores vem de bairros próximos, enquanto quem mora mais longe raramente aparece.
Tudo o que a gente tem é fruto do trabalho na feira. Nunca pensei em fazer outra coisa. Na idade que a gente tá, a gente precisa focar no que construiu até aqui.
Mesmo assim, é possível viver da feira? Você se vê envelhecendo aqui com seu comércio ou pensa em fazer outra coisa da vida?
É possível, sim, viver da feira. Sabe por quê? Porque tudo o que a gente tem hoje foi construído com o trabalho da feira. A gente sempre pensa assim, quando envelhecer, vamos nos aposentar e voltar a morar no Cariri, mas no fundo o que a gente quer mesmo é continuar trabalhando na feira. Porque é aqui que a vida acontece pra gente. Alguns dos nossos clientes que vinham com os pais, hoje já vêm com os filhos, com os netos. É algo que passa de geração em geração. E tudo o que a gente tem é fruto do trabalho na feira. Nunca pensei em fazer outra coisa. Na idade que a gente tá, a gente precisa focar no que construiu até aqui. Foi da feira que eduquei minhas filhas, paguei escola, paguei minhas contas. Estudar de novo? Não penso mais nisso. A gente foi até o primeiro científico que era como chamavam naquele tempo. Mas hoje não tem mais como. A feira representa tudo pra gente. A gente vive da feira e com orgulho.
O que representa a feira central pra você? O que diria que ela te deu ou tirou de você?
De mim não tirou nada, a feira nos deu tudo.
EXPEDIENTE
Fotografia: Rafaela Egidio, Maiara Vitoria, Gabriela Ramalho, Karen Emanuella
Texto e Reportagem: Rafaela Egidio, Gabriela Ramalho, Karen Emanuella, Maiara Vitoria,
Supervisão Editorial: Rostand Melo, Ada Guedes
Comentários