A cearense, da cidade de Iguatu, chega por volta das 7:30 da manhã em sua residência, sempre entra por trás da casa, onde deixa tudo o que traz do hospital. É uma rotina de cuidados que a técnica de enfermagem adotou após estar trabalhando na UTI (Unidade de Terapia Intensiva).
Seus olhos cansados denunciam que a noite anterior não foi das melhores, mas, incrivelmente, sempre traz um sorriso no rosto, principalmente quando avista sua filha, Maria Luiza, de apenas 3 anos.
Às 8:00h outra jornada começa com as aulas remotas. Aos 28 anos e no oitavo período de enfermagem, a acadêmica só poderá descansar quando suas aulas terminarem, por volta das 10:30. Uma rotina que não se encerra por aqui. Mãe solo, Karliany Bezerra acompanha a realização das atividades da filha que está iniciando sua vida escolar.
A técnica nunca teve o sonho de ser enfermeira, foi por ironia do destino que acabou optando pelo curso. “Só tinha enfermagem e informática, então escolhi o que tinha mais afinidade”, nos diz. Entre muitos sonhos, Karliany teve sua primeira filha aos 24 anos. Faltando apenas cinco dias para completar os 25, ela deu à luz a uma menina.
“A experiência de vida mais marcante foi ter me tornado mãe. O nascimento da Maria Luiza mudou todos os meus planos de vida. Mudou a forma de ver a vida”, diz com um largo sorriso no rosto.
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Entre estudo e trabalho, Karliany guarda um tempo para sua filha/ Fotos: Felipe Bezerra
Com oito anos de profissão, Karliany teve sua primeira experiência com UTI na cidade de São Paulo - SP quando decidiu ir com o ex-marido cuidar do sogro adoentado. “Tomamos a decisão de ir cuidar dele lá”, diz. Logo depois, já grávida, decide voltar à terra natal. “O motivo de ter voltado foi porque queria criar minha filha em um lugar mais tranquilo e perto de minha família”, relata. Na cidade de Iguatu, Ceará, teve contato com a pediatria, entretanto a técnica não se adaptou:
“Eu sofria muito ao ver uma criança morrer, me colocava demais no lugar daquelas mães.”
O convite para UTI
Em junho de 2020, Karliany recebeu a proposta para trabalhar na UTI Covid-19. A técnica, ainda um pouco apreensiva, aceitou o desafio. “A coragem de aceitar o trabalho na UTI veio da fé. De acreditar na proteção de Deus”, contou a técnica. "É difícil. Tanto a questão física porque é muito cansativo, como a mental mesmo” nos relata ao ser indagada como estaria sendo essa etapa.
No início, a estudante de enfermagem chegava a trabalhar 24 horas corridas. “Estavam tendo muita dificuldade para encontrar profissionais que quisessem trabalhar na UTI”. Na entrevista, notamos Karliany sempre sorridente e simpática. Ao ser questionada sobre como ser forte em momentos tão difíceis, ela nos respondeu:
“Me manter forte e sorridente é uma forma de gratidão com a vida. O fato de ver muitas pessoas morrerem, perderem familiares, me faz valorizar mais a vida.”
A religiosidade como tradição
Força feminina: Karliany, sua avó, mãe e filha posam em frente a capela/ Fotos: Felipe Bezerra
Crescida em um lar católico, a fé sempre esteve presente na vida de Karliany, que desde cedo frequenta as missas aos domingos. “Nasci em um lar católico e desde pequena frequento a igreja, já frequentei outras igrejas, mas não me identifico”, diz. A avó, dona Expedita Bezerra Rodrigues, matriarca de 73 anos, construiu uma capela em casa onde todas as noites é lido o mistério do terço. Os filhos, netos e bisnetos se unem para orar e pedir graças ao Senhor. É nesse cenário que a técnica cresceu com muita fé. “Minha avó passou para minha mãe, que passou para mim e eu pretendo passar para minha filha”, relatou.
FICHA TÉCNICA
Fotografia e texto: Felipe Barros, Felipe Bezerra e Micaela Nogueira
Monitoria e redes sociais: Manoel Cândido, Josineide Barbosa e Louise Viana
Supervisão Editorial: Rostand Melo e Ada Guedes
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