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Aramy Fablicio: Ativismo ambiental e a luta por um mundo sustentável

  • Eduarda Ferreira, Geyferson Guilherme, Joana Elen
  • 27 de mai.
  • 7 min de leitura

Foto: Geyferson Guilherme
Foto: Geyferson Guilherme

Natural de Fagundes, cidade localizada na Região Metropolitana de Campina Grande-PB, o ambientalista Aramy Fablicio, 58 anos, faz do mundo o seu escritório. Independente, desde menino mostrava sensibilidade com os animais, com a fauna e a flora da região. Hoje, não mede esforços para defender a preservação da vegetação nativa da região. Fomos recebidos na Pedra de Santo Antônio, local que hoje é sua principal área de atuação, para uma conversa sobre sua vivência, participação e envolvimento com as causas ambientais.


Quem é Aramy Fablicio? Quais suas crenças? O que o motiva? O que gosta de fazer?


Sempre fui uma criança normal, mas eu tinha o meu mundinho. Quando comecei a observar as coisas, me senti um cara diferente, eu não me enquadrava dentro do estilo, do comportamento, da cultura das pessoas da época. Eu cresci durante uma ditadura militar, vivi a guerra fria, vibrei na queda do muro de Berlim, estive nas ruas a favor das “Diretas Já”; dos movimentos “Abaixo a Ditadura” e “Fora Collor”, vivi tudo aquilo ali, eu já era um punk. Fui criado na fazenda dos meus avós e eu não concordava muito com o que eu via e o que as pessoas tentavam me condicionar a achar que era normal. Para mim era bizarro a judiação com animal, aprisionar, enjaular, abater. Todo mundo era caçador de animais. Falavam que aves eram uma peste que nunca ia acabar, mas eu tinha sensibilidade com os animais, e na minha mente eu sabia que ia acabar, porque de onde se tira e nunca se repõe, vai acabando.


Você possui uma forte ligação com a cidade de Fagundes. Como foi sua infância aqui? Existe alguma pessoa da cidade que considera sua inspiração? O que mudou daquela época até hoje?


Meus avós foram muito importantes na minha formação. Meu avô, Manoel Fablicio, era analfabeto, mas foi violeiro e repentista. A primeira vez que um cara me deu um pássaro numa gaiola, ele quando viu, falou: “isso não é coisa de homem não, isso é coisa de ‘cabra safado’”. Eu era muito criança, não entendia, mas já tinha noção de que ele tinha razão. E também tem a minha avó, Emilia Peixoto, que contava as chamadas “histórias de trancoso”, eram histórias bem interessantes de assombração, tudo que ela contava era interessante. Ela chegou aos 102 anos de idade e foi responsável por muita coisa que aprendi.


Como surgiu essa identificação com a causa ambiental? Como percebeu que queria tornar isso o seu objetivo de vida?


Vou ser bem honesto com vocês, naquela época não existia a palavra ‘ecologia’, não existia ‘causa ambiental’, nada. Eu era ridicularizado, mas foi muito interessante porque um tempo depois, assistindo um telejornal na TV Tupi, vi uns malucos com a barba grandona, uns cabelos grandes, naqueles boats com a frase “save the whales” que significa “salve as baleias”. Era a galera do Greenpeace, aí eu vi aquilo e pensei: “pô, tem uns malucos igual a mim que gostam de salvar os animais e tão aí brigando pelos animais”. Pensei então: “legal, tem mais louco igual a mim”.


Seu pai foi um político respeitado. Já pensou em enveredar pelo mesmo caminho e aproveitar o poder público a favor da causa ambiental, considerando que mesmo sem ocupar formalmente um cargo na política, você é visto pela comunidade local como uma figura de liderança?


O meu pai foi da área jurídica, foi um homem muito inteligente e ele era político. Ele queria que eu fosse político e da área de direito, um jurista. Duas coisas que eu odeio. Eu queria ser músico, mas se eu fosse falar pro meu pai naquela época, o que ele ia dizer? Aí para agrada-lo eu falei que ia tentar fazer o vestibular para agronomia. Eu achava que seria a coisa mais próxima da causa animal, quando na verdade, a agronomia destrói a natureza, então seria outra porcaria. Depois eu fui muito procurado pelos partidos políticos, e até hoje eu sou procurado, mas se eu não quis há mais de 40 anos, por que vou querer agora?


Teve algum acontecimento específico que te marcou e se tornou o gatilho para a criação dos seus projetos? O que, na comunidade, te fez sentir a necessidade de agir e tomar essas iniciativas?


Começou na fazenda dos meus avós. Quando eu era criança idealizei meu primeiro projeto, o que eu mais amo, o começo de tudo, que foi o "Biqueira Velha". Para quem não sabe, biqueiras são aquelas calhas de zinco, que reaproveitam água da chuva. Eu cortei um pedacinho de zinco com uma faca e coloquei a placa "proibido caçar e capturar animais" na porteira dos meus avós. Mas lógico, esse tipo de iniciativa de uma criança… era motivo de riso. Depois um fazendeiro me abordou e pediu para eu fazer uma plaquinha daquelas porque ele não queria mais ninguém caçando na propriedade dele. Aí eu pensei: "nossa, que legal!" e fiz com o maior prazer, porque eu só precisava de duas coisas: minhas mãos e minha boa vontade. Aí foi virando uma febre e daqui a pouco eu sozinho já não dava mais conta de fazer tantas placas, e Fagundes foi tomada por elas.


O Biqueira Velha foi o seu primeiro projeto. Como foi o processo de criação e implementação dos projetos seguintes na cidade?


Em seguida eu idealizei o Natureza Livre, onde se o proprietário tivesse a placa indicando que é proibido caçar animais, nenhum intruso entraria no local, aí o interessante é que se o cara tem 50 hectares de terra, com mais 1 de um senhor mais humilde, já são 51. Isso se torna um elemento multiplicador, não importa o tamanho da área territorial, essas terras se tornam área de soltura para os animais, eles podem atravessar de uma cerca para outra e ninguém vai capturar eles. Daí eu idealizei o Plantando na Escola, nele eu dava palestras para as crianças nas escolas, transmitia mensagens ambientais, e depois plantava um banco de mudas em recipientes reutilizados. Eu fazia aquela mistura orgânica de terra, pedia para elas trazerem as sementinhas de casa e as crianças enchiam os vasos com a maior felicidade. Depois criei o Arte de Reciclar, que serviu para ajudar a gerar mais renda pro pessoal da comunidade, transformando lixo em luxo. A maior invenção do projeto foi a réplica em miniatura da Pedra de Santo Antônio. Cada projeto, na verdade, é consequência, filho de outro.


Foto: Joana Elen
Foto: Joana Elen

Muitos ativistas enfrentam críticas e resistência. Existe isso com você? Como lida com quem tem pontos de vista opostos aos seus?


Quando eu era jovem, era ridicularizado porque não tava 'causando'. Mas aí na hora que você se torna uma figura pública e defende minorias, incomoda os grandões. Eu costumo ser amigo de todas as pessoas e tenho esse ímpeto de ajudar pessoas de baixa renda, mas o ser humano sabe se defender. A natureza não se defende. Tem que ter alguém pra falar em prol dela. Desde criança eu trabalhei no campo, comecei a apagar incêndio nas propriedades. Não fazia por alguém em específico, mas porque se eu não tomasse uma atitude, muitos animais iam ser extintos e eu podia fazer algo de forma voluntária, então eu passei a combater fogo nas propriedades de várias pessoas e fui desenvolvendo muitas técnicas. Já viajei o Brasil todo como brigadista.


Em uma matéria publicada em seu site, você relata agressões sofridas durante uma de suas ações contra a derrubada das árvores nativas da praça de Fagundes. Episódios de hostilidade como esses são recorrentes? Qual você consideraria o maior risco da sua profissão e como isso afetou sua determinação e abordagem?


Eu fui preso. Tinha umas árvores no centro de Fagundes que estavam lá há mais de 100 anos que seriam derrubadas. Eu fiz um banner e quando cheguei lá, o cara já tava com uma motosserra e já tinha cortado um galho. Eu fui pra debaixo e fiquei lá abraçado com o tronco da árvore, depois de um tempo os "leões de chácara" da prefeitura chegaram e no fim, apanhei mesmo. Quem me safou foi uma senhorinha que me conhecia, ela chegou e falou: "se for bater em Aramy agora, vai ter que me agredir também", aí eles recuaram. Depois chegaram os policiais, pensei que iam me ajudar, mas me deram voz de prisão, me jogaram dentro do camburão e me levaram para a delegacia. Eu não sei se hoje em dia eu faria a mesma coisa, as árvores, os animais mereciam a minha atitude, mas as pessoas não.


Há 13 anos você esteve em São Paulo divulgando seus projetos. O que mudou desde então?


Eu já rodei o Brasil divulgando meus trabalhos ambientais. Vários canais de televisão, principalmente a TV Cultura, davam muito espaço para mim; a CBN, a rádio Globo, na época. Já fui cinco vezes para a Europa trabalhar com manejo de animais. Eu não ganho dinheiro para ir pra lá, eu trabalho voluntário, é tudo pela comida e pela amizade. Eu sou quase um bicho do mato, tanto faz aqui no Brasil eu cuidar de um mamífero como lá na Europa, não vai fazer muita diferença não [risos].


Quais os seus planos para o futuro? Já existe algum projeto novo em andamento que possa contar um pouco para a gente?


Projetos eu tenho muitos, meu sonho é catalogar todas as árvores daqui da região, essa área de Fagundes é muito rica por ser uma área de transição entre a caatinga e a mata atlântica. O que eu faço não é mais para mim, é para as futuras gerações. Quero deixar um legado, porque eu não acredito que vai dar mais tempo e isso não quer dizer que eu sou pessimista, eu sou tão otimista que estou brigando por uma causa perdida. Os animais estão sendo capturados, o planeta já está no extremo, a mudança teria que ser muito radical. A ideia é que estou fazendo a minha parte para que as futuras gerações tenham um mundo melhor do que o atual.


Veja mais fotos abaixo:


EXPEDIENTE:

Entrevista: Eduarda Ferreira

Edição de Texto: Joana Elen

Supervisão Editorial: Ada Guedes e Rostand Melo

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